Quem és tu no Japão?
Cortar o cabelo no Japão - Não me sai da cabeça

Cortar o cabelo no Japão - Não me sai da cabeça

Cortar o cabelo é, para mim, um momento muito gratificante.

Não só porque gosto da sensação de mudança que, nem que seja por breves segundos, nos faz sentir como se recomeçássemos uma nova etapa na nossa vida. Mas também pela atenção e conversa que temos com o barbeiro/cabeleireiro, que não nos corta só o cabelo mas corta na casaca de diversas personalidades, que vão desde o football até à política.


Considero por isso um momento de imersão cultural e social de uma comunidade.


Talvez por essa razão, tenho o hábito de ir cortar o cabelo sempre que vou a um país estrangeiro.
Aprende-se muito com as pessoas que lá estão a cortar o cabelo, e com os que estão à espera. Até os simples cortes que se usam em cada país já nos dizem muito sobre a cultura.
Mas foi no Japão que tive uma das experiências mais interessantes.

Não sei se vos acontece o mesmo, mas a parte mais difícil para mim quando vou cortar o cabelo é quando me perguntam “Como é que vai ser?”
Dizer “- O costume”, para uma pessoa que gosta sempre de inovar e que já teve o cabelo de todas formas possíveis que vos possam passar pela cabeça, não é opção.


Por isso, digo como pretendo sentir-me ou parecer depois do corte, e deixo nas mãos do profissional.

Talvez por essa razão, tenho um grande amigo, que me diz sempre que o vejo, que temos de falar sobre o cabelo.


Ora, falar de como nos queremos sentir depois de um corte já é difícil em português, piora um pouco em inglês, mas torna-se um desafio em japonês.
Não só porque o meu japonês é o equivalente ao de uma criança de 8 anos, mas também porque os japoneses gostam muito de fazer o que lhes é pedido, da melhor maneira possível.


Cortando a direito: Quando lhes dizemos que está por sua conta, dá-lhes um nó na cabeça.

 

O cabeleireiro japonês que já estava pelos cabelos

A escolha do cabeleireiro foi completamente aleatória, como sempre faço. Vou a passar por um, dá-me na cabeça cortar o cabelo, e entro. Foi assim em Ginza. O Ritual consiste em tirar uma fotografia antes de cortar o cabelo. Cortar o cabelo. E por fim tirar uma fotografia depois de cortar o cabelo.


Quando entrei no cabeleireiro em Ginza vieram ter comigo à porta duas mulheres japonesas que me saudaram com o famoso irasshaimase (Bem vindo). Perguntaram-me o que pretendia e eu disse o que tinha na cabeça: Cortar o cabelo.


Ficaram um misto de surpreendidas e entusiasmadas com a ideia. Foram imediatamente chamar o cabeleireiro principal (funciona melhor para o trocadilho em inglês: Head hairdresser), que chegou com um ar simpático mas que não dava para esconder o nervosismo.


Sentei-me e quando me perguntou como é que pretendia o corte, eu tentei dizer-lhe que queria como ele acharia melhor para o meu caso.
O homem ficou desorientado. Para tentar definir mais as minhas intenções, mostrou-me revistas com cortes para ver se eu indicava um caminho.

Eu insistia que deixava ao seu critério.


O japonês já estava pelos cabelos com a minha teimosia até que arriscou e começou a cortar ao seu gosto, tendo sempre muito cuidado de ir perguntando se estava a gostar e se tudo estava ok.


O resultado final foi muito bom mas o que gostei mais foi de ver o ar de satisfação do cabeleireiro e equipa ao ver que tinham conseguido completar a tarefa que lhes pedi, dando-lhe total liberdade.


Para mim ficou provado que conseguir ou não conseguir fazer o que nos vai cá dentro, depende da confiança.

Está tudo nas nossas cabeças.

 

10 FEVEREIRO 2020

AUTOR: JORGE FERRAO